29.3.08

Não há nada. Em mim não há nada. Estou mais vazia que o próprio ar que ainda aparenta estar fora de mim. Tudo o resto está a quilómetros de distância. Criei o meu próprio deserto da ilusão. Ou o que pensei ser a realidade é no fundo a minha ilusão. Não importa agora. Nada realmente importa agora.
Vejo-me como se estivesse dentro do meu corpo, mas até eu fugi de mim, ou então tento numa promessa vã. Eu queria sentir-me dentro de outro corpo. Um corpo melhor. Uma vida melhor. Um algo inexplicavelmente repleto de coisas que me fizessem sentir numa realidade fora da ilusão que criei. E são raras as vezes, talvez não tão raras, que consigo sair do meu corpo e viver a vida de alguém. No entanto, agora vejo-me como se estivesse dentro do meu corpo. Vejo as mãos e os braços nus e pálidos num fundo de areia que se confunde com a minha cor. Os meus pés descalços movem-se para um nada que é igual àquilo que tenho. Não há nada. Não há nada aqui, nem ali, nem além. O desespero do nada, mais o desespero do vazio é igual ao cair por terra. Vejo o meu corpo cair tão lentamente, como se nem ele tivesse vontade. Vejo o meu corpo cair, vítima de uma bala perdida inexistente mas não ausente. Vejo os pés moverem-se e cada vez mais a ficarem presos. Os passos presos, as mãos a serem devoradas pela cor daquela areia. As pernas a serem engolidas. O tronco. O pescoço. A boca a engolir o sufoco do vazio. As areias a preencherem o que eu não tenho. O grito preso em cada partícula de ar que se difunde com as partículas de areia. Cada fio de cabelo a transparecer o meu chão. O corpo a ser engolido pela areia numa manhã que pouco diz. Nada me diz. Pouco, é outra ilusão para não se dizer que não se tem nada, ou não se quer nada. Não há nada. Em mim não há nada.
Agora o momento é feito para me esquecer. Ninguém pergunta por mim. Nem o meu corpo é encontrado. O deserto está finalmente deserto. Não há nada. Em mim não há nada, porque eu não existo.

8 comentários:

Anónimo disse...
Este comentário foi removido por um gestor do blogue.
Cão disse...

O mundo existe, tu existes, o todo existe, mas não o procures...deixa-o vir ao teu encontro...se não te encontrou é porque não é digno de ver a perfeição que te constitui cada pedaço de ti...vives na tristeza de um todo que não te serve mas ele irá adapatar-se a ti e acabará por te descobrir...
Vou ser alfaiate por uns tempos e ajustar o todo a ti amor....

Anónimo disse...

Tu és! Tu existes! Tenho a certeza. Porque sinto o pulsar do teu coração dentro do meu peito. O pedacinho que deixaste ficar antes de partires de mim...

P disse...

Não há nada. Em mim não há nada. Estou mais vazia que o próprio ar que ainda aparenta estar fora de mim. Tudo o resto está a quilómetros de distância. Criei o meu próprio deserto da ilusão.

Gostei.
Abraço
p.

Sara Morgado disse...

Estar vazio por dentro e não ser nada. Nós não existimos dentro de nós e não há ninguém que teça as nossas palavras, não há ninguém que beba os olhares que não são de ninguém, talvez por vivermos espalhados por todos.

Pedro Correia ou Poeta Acácio disse...

é pena é o governo que temos existir... hehehehe

politiquices à parte: boa, pirima! muito bom mesmo!!!!!

TENHO DITO

Anónimo disse...

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cljp disse...

Existem as tuas palavras e o se poder.